segunda-feira, 20 de julho de 2009

Da Exposição "Vestígios..." - objectivos e oportunidade

Foi inaugurada no passado dia 18 de Julho a exposição "VESTÍGIOS..." - Património Arqueológico e Arquitectónico da região de Moncorvo, contando com a presença dos Srs. Presidente da Câmara Municipal de Torre de Moncorvo, Presidente da Direcção do PARM, Presidente da Mesa da Assembleia Geral também da nossa associação, funcionários do Museu, estagiárias, vários associados, e outras pessoas interessadas.

Painel de abertura, com o título, texto introdutório e uma imagem da mítica Santa Cruz da Vilariça, onde fizémos escavações entre 1989-1992 e onde temos feito inúmeras visitas guiadas (foto Patrick Esteves/Foto-Bento)

Esta exposição constitui, fundamentalmente, um olhar fotográfico a partir do arquivo do arquivo da nossa associação, reunindo imagens de elementos arqueológicos e patrimoniais de maior relevo identificados na região de Moncorvo, com alguns textos de enquadramento sobre os períodos cronológicos a que dizem respeito, e complementada com diversos objectos arqueológicos recolhidos em actividades de prospecção e escavação, nos anos 80 e 90 do séc. XX.

O Dr. Rui Leonardo (co-organizador da exposição) explicando o período "castrejo" (Idade do Ferro), em que se situa o achado dos sete berrões das Cabanas de Baixo, há mais de um século, pelo abade Tavares (foto de Patrick Esteves/Foto-Bento)

A ideia da exposição começou a germinar nos inícios de 2009, depois de dois elementos do PARM (N.Rebanda e Rui Leonardo) terem compulsado os ficheiros do Inventário Arqueológico do concelho desenvolvido pelo PARM nos últimos 25 anos e os respectivos arquivos fotográficos, trabalho que fizeram em finais de 2008 com vista à actualização da Carta Arqueológica para o PDM (entregue nos inícios de Janeiro), dando conta da necessidade de se fazer um novo balanço do que se fizera em todos estes anos. Na verdade, nos primórdios da nossa actividade, logo em 1985, foi feita uma mostra de Arqueologia num espaço anexo à igreja da Misericórdia, organizado por N.Rebanda, com apoio da Câmara Muncipal e do GAT (Arqtª. Ana Maria Rodrigues), no contexto de umas comemorações sob o tema "Os portugueses e o mundo". Depois, em 1986, no Mercado Municipal, foi feita nova exposição, consideravelmente ampliada, a qual foi reeditada em 1987, aquando de uma visita do então presidente da República, Dr. Mário Soares. Muitas das fotografias agora utilizadas foram aproveitadas dessa exposição de 1986, já que muitos dos motivos representados ou já desapareceram ou foram transformados.

Explicando o período da Romanização, em que se destaca o habitat romano de Vale dos Ferreiros, destruído em 1983 por uma barragem (foto Patrick Esteves/Foto-Bento)


Como se diz logo ao início da Exposição, somos tributários do trabalho realizado por pioneiros como o Abade José Augusto Tavares (1868-1935), Prof. Doutor Santos Júnior (1901-1990), Prof. Doutor Adriano Vasco Rodrigues, entre outros. No entanto, a nossa actividade foi a que teve maior continuidade no tempo, envolvendo a realização da Carta Arqueológica do concelho e um projecto de investigação centrado no período medieval, com várias prospecções e escavações.

Da acção directa do PARM ou dos seus membros resultaram descobertas da maior importância para Arqueologia portuguesa, como foram o caso das gravuras rupestres paleolíticas do cavalo de Mazouco (concelho de Freixo de Espada à Cinta), de Foz Côa, e Ribeiro da Sardinha (Felgar), das estelas calcolíticas de Assares (concelho de Vila Flor), da estela-menir da Vila Maior (concelho de Torre de Moncorvo), entre outros achados, durante os anos 80 e 90.

Grupo de visitantes observando o painel sobre o Castelo de Torre de Meem Corvo (foto N.Campos)

A somar a isto também houve alguma intervenção na defesa do património, um vector sempre problemático e polémico, infelizmente nem sempre compreendido pelo comum das pessoas.
Na medida do possível foram feitas acções de divulgação do património, junto das escolas, com inúmeras visitas guiadas por todo o concelho. Destacamos, nos últimos anos, a título de exemplo, os Passeios Culturais e a participação no programa Ciência Viva. Presentemente este aspecto tem sido desenvolvido sobretudo no quadro do Museu do Ferro & da Região de Moncorvo, gerido segundo um protocolo entre o Município de Torre de Moncorvo e o PARM, como se sabe.



Vitrina com diversos objectos recolhidos nas escavações de Santa Cruz da Vilariça (dirigidas por N.Rebanda) e no Castelo de Moncorvo (dirigidas por N.Rebanda e, posteriormente, pela equipa de Pedro Sobral/ArqueoHoje) - Foto Patrick Esteves/Foto-Bento)

Todavia, estes aspectos não são referidos na Exposição, visto que o objectivo foi dar uma noção do património arqueológico e arquitectónico que existe no concelho e região e não propriamente contar aqui a história do PARM. Há, na verdade, uma história implícita, que nos chega através destes testemunhos, ou "Vestígios", e essa é a do Homem que através dos tempos aqui sempre viveu e sobreviveu...

"Vestígios" recolhidos em intervenções urbanas na vila de Torre de Moncorvo (séc. XVI-XVIII) - Foto Patrick Esteves/Foto-Bento

Uma história feita da luta quotidiana pela mantença, mas também de algumas invasões, como a romana, a dos bárbaros, a dos "mouros", ou, mais tarde, de castelhanos ou espanhóis. Daí as muralhas e os castelos, mas também houve lugar à afirmação da espiritualidade pela arquitectura (igrejas de Adeganha e Torre de Moncorvo, igreja da Misericórdia, capelas) e pela arte (recheio de igrejas e capelas, ou pinturas do eremitério da Srª da Teixeira), ou seja, o facto cultural em última instância. Essa cultura erudita deu trabalho a mestres canteiros e humildes pedreiros, que não só edificavam igrejas, fontes e chafarizes, mas também foram erigindo e transformando os solares das classes possidentes. Aqui terá surgido uma verdadeira escola de mestres canteiros e de outras artes. que se sabe terem arrematado trabalhos na Sé de Miranda (desde o séc. XVI e XVII) e, um deles, o mestre António Lopes de Sousa, na segunda metade do séc. XVII, ter construído a ponte de Remondes (sobre o rio Sabor) entre os concelhos de Mogadouro e Macedo de Cavaleiros.




Visitantes observando diversos vestígios da chamada "cultura material" do período medieval (foto Patrick Esteves/Foto-Bento)


Nos painéis finais há referência à viária, nomeadamente aos belíssimos "caminhos antigos", alguns registados fotograficamente há mais de 20 anos, e hoje irremediavelmente perdidos, devido ao sistemático labor de destruição empreendido por entidades públicas e privadas, em nome de uma maior comodidade para se levar a carrinha ou o tractor aos prédios (alguns deles hoje ao abandono). Um desses troços, em lajes de xisto colocadas de cutelo, foi registado em fotografia a preto e branco, nos anos 80, pouco antes de ser "varrido" pelo troço do IP-2 entre o Pocinho e a ponte do Sabor. Curiosamente a parte terminal desta estrada vai em breve ser submersa, tendo funcionado menos de 20 anos...

Vista geral da Exposição, no Auditório do Museu do Ferro (foto Patrick Esteves/Foto-Bento)

O último painel é dedicado à Arqueologia Industrial e Mineira. Em rigor, o "industrial" aqui é apenas o proto-industrial (com a ferraria-forja de Chapa-Cunha, do séc. XVIII-inícios de XIX), alguns lagares de azeite do final do séc. XIX/inícios de XX (hoje ao abandono e em ruínas), a fábrica de cobertores do Felgar (de que, infelizmente, parece ter desaparecido a grande roda hidráulica, levada pelos sucateiros, segundo nos informaram dois felgarenses que estiveram presentes à inauguração), e, finalmente, as infraestruturas da Ferrominas no alto da Carvalhosa, cujo processo de vandalização e de saque ainda não terminou...

Espera-se que esta exposição funcione também como um alerta pela preservação do pouco que ainda resta, em termos de património arqueológico e arquitectónico. Desde a abertura do Museu na sede do concelho tivémos sempre presente a ideia de se constituir uma pequena mostra didáctica, mostrando e explicando a Arqueologia e História do nosso concelho através de objectos recolhidos na região, com imagens de locais de interesse e dos monumentos existentes.

Quanto a objectos, lamentavelmente, nos últimos 100 anos, por não existir um museu em Torre de Moncorvo, muitos foram os que acabaram por ir parar a Lisboa ou a Bragança (e alguns de grande importância!). Esta exposição pode ainda ser um atractivo para que algumas pessoas possam vir a doar ao Museu objectos de interesse que tenham recolhido em trabalhos agrícolas, em obras, ou noutro qualquer contexto.
Dado o seu alcance pedagógico, é nossa intenção manter esta exposição com cariz permanente, como instrumento de apoio aos programas escolares e potenciando mais as visitas de estudantes e professores. A batalha do património ou se ganha com a Educação e com as novas gerações, ou está indefectivelmente perdida. Assim, teremos de escolher entre uma mera "Arqueologia de registo" do que vai ser destruído (muito pesarosa para nós, os que gostamos disto e que amamos estes pobres vestígios que nos deixaram os nossos antepassados, chorando depois sobre eles como sobre leite derramado) ou, em contrapartida, uma Arqueologia da Salvaguarda, de Preservação, de Valorização, de Recuperação, de Fruição... E é já um lugar comum dizer-se que só podemos amar o que conhecemos.

Temos uma História grandiosa que passa muito pela história do Ferro (aí estão também os escoriais para o atestar e as obras de ferreiro), mas que não é tudo. Daí que o conceito museológico que aqui sempre procurámos implementar tenha em conta a vertente ex-librística (Ferro), mas também o seu enquadramento histórico, as outras actividades, agrícolas (e agro-industriais inclusive, com a história do Cânhamo, que também está por contar), pastoris, mercantis, artesanais (ofícios), proto-industriais (molinologia, ferraria de Chapa-Cunha, indústria têxtil), serviços, etc..

- Brevemente (dia 8 de Agosto) contamos realizar uma palestra que tem por pano de fundo esta mesma mostra. Mantenha-se atento e... entretanto visite a Exposição!

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NOTA DE AGRADECIMENTOS

A Direcção do PARM e Organizadores da Exposição agradecem:
- à Câmara Municipal de Torre de Moncorvo pelo suporte financeiro que tornou possível esta exposição e pelo apoio logístico (transporte e motorista para transportar uma pedra decorada desde a Qtª. da Portela, e empréstimo de vitrinas da Biblioteca Municipal);
- à família Morais Vaz/Quinta da Portela, Amigos do Museu, pela cedência a título de empréstimo de uma pedra decorada românica proveniente da Canteira/Baldoeiro, sua propriedade;
- ao Encarregado de Pessoal da Câmara Municipal, Sr. António Manuel Gonçalves, pelo seu esforço na condução, carregamento e transporte da pedra decorada da Qtª. da Portela (peça com cerca de 200kg);
- à Junta de Freguesia de Torre de Moncorvo, pela cedência da viatura e do seu funcionário, Sr. Daniel … , para transporte das vitrinas da Biblioteca;
- à FotoBento (Torre de Moncorvo), na pessoa dos Srs. Tony Bento e Patrick Esteves, por toda a dedicação e empenho na qualidade do trabalho fotográfico e de impressão, tendo o Tony aguentado uma “noitada” desde as 21;00h até às 6 horas da manhã, a fim de se aprontar os painéis;
- à serralharia Irmãos Amaral, Amigos do Museu, em especial ao Zé Amaral, pela sua prontidão e eficiência na construção de suportes para materiais pétreos;
- ao Sr. Manuel Cândido, também Amigo do Museu, pela sua colaboração sempre pronta;
- ao restaurante “O Lagar” pela oferta de um almoço ao pessoal do Museu e do PARM no dia da inauguração da Exposição;
- ao pessoal do Museu e do PARM: António Botelho, Fátima Dias, as estagiárias Ana Teixeira e Lucy Pissarra, Higino Tavares.
Pedimos desculpas antecipadas por alguma omissão, na certeza de que será involuntária.
Para todos, um grande abraço!

1 comentário:

Anónimo disse...

Parabéns!

Grande iniciativa que deve ser visitada!